terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Londres – Capitulo I - Harrods

Fui a Londres faz agora 5 graus a menos. Lá, nem por isso fazia. O móbil foi uma visita à minha cunhada imigrada, que tenta, em chances de coragem, mais uma estação de metro nesse comboio que é a sua viagem de vida. È assim com todos nós. Grande admiração pela tua entrega aos sonhos, Di.

Na verdade, a minha mulher queria fazer compras de Natal e lá fomos nós. Temos este prazer em comum. A alternância que vem da mistura de regar o ego com novos objectos pessoais e o enriquecer da mente quando nos embrenhamos em diferentes tempos, pessoas e estações…de metro. Por outras palavras, fazer compras enquanto se sente a historia de um outro povo.

Nesse nosso périplo decidimos ir ao Harrods. Local obrigatório para um parolo como eu que apenas tem dinheiro para entrar porque não se paga à entrada.

Não deixa de ser um fascínio mórbido, da maioria de nós, a ânsia de ver o preço de coisas que não podemos, de facto, comprar. È como voltar aos tempos de escola e sentir que o plafond do nosso cartão de crédito não é mais que a mesada que os nossos pais nos davam para comprar pastilhas gorila e que tornava a compra de uma bicicleta numa utopia reservada aos adultos. Somos crianças novamente a olhar para outro tipo de adultos. É como entrar num Stand da Ferrari. O que é que lá estamos a fazer realmente?

Estamos no Harrods. Mirei o preço de um Cavalo de Pau, em carvalho, como qualquer outro cavalo de pau que se vende na feira. Custava perto de € 6.000,00 (já com a conversão de Libras para Euros). Ou muito me engano ou por este preço comprava um cavalo a sério e forrejo para um ano inteiro. Aparentemente sem lógica à vista. Continuei.

O Harrods tem, no entanto, uma zona para crianças como eu. “Recuerdos” chamar-lhe-iam os espanhóis. Lá comprei umas coisitas que servirão como troféu da minha humilde presença. Pedi para embrulhar. Embrulhar é no piso -1, Sir. No caminho para as escadas passei pela Casa de Banho. Toalhas de linho aquecidas e 6 frascos de perfume, das mais refinadas marcas, à disposição dos clientes. Comecei a entender a lógica do preço do Cavalo de Pau.

Descemos, perfumados, ao Piso-1. Por entre os constantes motivos Egípcios que marcam o espaço, surgia, ao fundo das escadas rolantes, uma espécie de memorial. Honrava o filho morto do dono da casa. Doddy morreu com a mulher que o acompanhava e à qual também era devota a homenagem. Todos nos recordamos do romance, acidente e fatalidade de Doddy e da Princesa de Gales num túnel de Paris, de curioso nome “Tunel da Alma”. Eram dois tontos, provavelmente apaixonados. Uma princesa detentora de segredos de estado e segurança do seu País e um empresário de magnitude com ligações umbilicais a um país do médio oriente…Acabou como era previsível.


Chegamos à zona dos embrulhos. Zona estranhamente calma e sem filas. Perguntei se me podiam fazer um embrulho. A senhora olhou-me com aquele ar paternal próprio de quem reconhece um espécimen fora do seu habitat. Disse-me, educadamente, que o tempo de espera era de 3 horas (!).

A lógica dos preços para “adultos” ganhou uma transparência cristalina.

Quem compra nestes sítios não tem apenas muito dinheiro. Nem são os Cavalos de Pau que me distanciam deste mundo. O abismo é o poder de compra de um dos bens mais preciosos, o tempo.



2 comentários:

Diana d'Oliveira disse...

Lindo... amei!! Obrigada também pelas palavras da primeira frase... disseram-me muito mesmo...

Foi bastante bom ter-vos cá... adorei mesmo! Espero que voltem...

Vasco Gaspar disse...

Fantástico! Muito bom mesmo! Captaste toda a essência da coisa!